Quando surgiu, ainda virgem, nos quiosques, num clima completamente diferente, muito mais propício a quem queria fazer jornalismo (mas jornalismo mesmo), o jornal propôs-se a mudar o panorama da imprensa em Portugal. Os fundadores sabiam que bastava acreditar ser possível criar um produto para lá do institucionalismo dominante.
A minha relação com o defunto T&Q remonta aos primeiros anos de vida do jornal: Assim que aprendi a ler, aprendi a lê-lo todas as sextas-feiras. O meu pai comprou-o desde o primeiro número. "Faltaram-me um ou dois", comentou. "É obra", respondi-lhe. Quem não lhe seguiu os primeiros anos não vai perceber o que significou o logótipo em tons laranja, que também foi programa de televisão.
A publicação de 'cachas' que abalaram a moral de um país cinzento, de velhas de bigode, costumes pacatos e promiscuidade disfarçada não é 'cousa' que se apague da memória colectiva.
Recordo-me sempre da história da D. Branca e ontem voltei a passar em revista as páginas desse número histórico.Na última década, o Tal & Qual tornou-se uma sombra de si mesmo. Perdeu entusiasmo, ao mesmo tempo que deixou fugir a garra que lhe deu lugar certo nas manhãs das sextas. Desinvestiu-se no jornalismo pensado, trabalhado.
O semanário fez-se folhetim, relator da notícia rápida de secretária. Com uma redacção presa ao imediato, a irreverência do desprendimento foi rapidamente substituída pela imediato da transcrição.
Um jornal fechado em si mesmo é um produto igual a tantos outros. O jornalista refém da redacção, sem a autonomia da pergunta, a exigência do confronto, é um gestor de conteúdos, obrigado a dactilografar 28 páginas do que quer que seja.
Jornais que abrem e jornais que fecham são a consequência natural de um mercado pequeno, armado em gente grande. Num país que não lê, no meio de um 'povão' que não quer, simplesmente, saber, ser-se medíocre é fácil. O problema é ser medíocre, convencido de que se é bom.
Nos últimos anos vi fechar a Capital, o Comércio do Porto, o Independente e agora o Tal & Qual. Todos eles desapareceram por um motivo: Não tinham leitores e sem leitores não há vendas, sem vendas não há publicidade, sem publicidade não há receita, sem receita não há jornal. Em comum, o facto de terem sido grandes à sua escala e deixarem a grandeza escapar.
O Miguel Esteves Cardoso disse certo dia que um jornal não tem que durar para sempre. Acrescento que é preferível desaparecer no momento em que deixa de fazer sentido. Reinventar um jornal só porque sim é condena-lo a um lento definhar, a uma morte dolorosa.
Como jornalista, acredito hoje um pouco menos na profissão. Tenho pena, essencialmente, pelos oito colegas que aguentavam 9000 exemplares vendidos. Eles, agora, como eu, um dia, vão passar recibos verdes para outro lado.