18 de agosto de 2009

Nota de suicídio (ou pelo menos de despedida) de um homem esclarecido que não eu

Caríssimos,

Acredito-vos capazes de perdoar a soberba que, por certo, encontrarão no tom desta missiva, por sinal a última que vos escrevo.

Admito alguma arrogância, mas compreenderão que ela é própria de quem já viveu tudo o que esperava viver e que por isso já não encontra na vida terrena o consolo que outrora esta lhe ofereceu.

Claro que para o caso contará em igual peso o facto de eu não cuidar de saber, por um fragmento de instante – reparem na imensidão da pequenez – da vossa opinião sobe mim ou sobre a pouca modéstia destas linhas.

Tempos existiram em que o bom agrado e a boa aceitação eram para mim tudo. Hoje são nada, como nada é o que espero em retorno. Que se lixem vocês.

Passo a explicar.

Levo uns generosos anos de vida e passei uma boa parte dos quais preocupado com o tipo de sensação que as minhas acções provocariam nas pessoas. Ora, isso é uma parvoíce. Primeiro, as pessoas, as tais, não merecem e ponto. Segundo, mesmo que merecessem, eu sou, de facto, muito mais importante do que qualquer um de vós.

Descobri agora, e por isso só peço perdão pelos anos que demorei a entender,que consigo viver sem ter ninguém. Eu basto-me e se me tivesse bastado mais, teria, provavelmente, aproveitado melhor o tempo predestinado como meu. E não tomem esta predestinação como divina, pois não o é, de facto (se fosse, seria o assumir da necessidade de um Deus e a negação da minha aqui apregoada justaposição).

O que interessa é que percebi, retomo o raciocínio, que, de uma maneira geral e quase permanente, vocês trataram de ser uns idiotas maiores do que eu próprio. Não pelo que passaram o tempo a fazer – servindo-se da minha disponibilidade quase feudal – mas porque acharam que eu nunca perceberia o que me andavam a tramar.

Estúpidos.

Como podem ver, custou mas cheguei aonde vale a pena estar e agora cá estou: O ciente da inabalável razão.

Gosto de vocês. “O tipo endoideceu”. Não, nada disso. Gosto de ter cada um de vocês por perto. Sempre gostei. A diferença, maintenant, é que não preciso dessa proximidade (ou distância) para me sentir um homem integro. Vocês são bons, mas fundamental sou eu.

Foi o que eu disse,

2 comentários:

Alda Couto disse...

Como eu o percebo! Seja lá ele quem fôr...

andorinhaavoaavoa disse...

Podemos achá-lo egoísta ou egocêntrico, mas a verdade é mesmo essa! Temos de ser sempre mais nós!