10 de fevereiro de 2011

Tempo

Há dias, numa mesa com amigos, alguém se virou para mim e proferiu a derradeira sentença: "tu és um homem com certezas, sabes bem o que queres da vida". Ali, sem apelo nem agravo, numa única frase, tentou-se definir aquilo que sou. Ainda arrisquei contra-argumentar, contudo, perante tamanha clarividência, desisti.

De facto, sou tudo menos "um homem com certezas". Aceito, tenho uma vaga ideia do percurso que gostaria de percorrer, mas, tirando isso, não sou capaz de afirmar o que devo ou devem esperar de mim.

Seria um disparate pensar que, aos 28 anos - sim, é só essa a minha idade - poderia ter a vida projectada. Nada disso. Aliás, quanto mais experiência tenho, mais ridícula e desnecessária me parece a pretensão de planear o que pretendo fazer (planear o que quer que seja).

Perdemos muito tempo em conjecturas. Gastamos demasiadas energias - e caímos em demasiadas depressões - porque estamos sempre na expectativa. Claro que devemos ter metas. Eu tenho-as. São objectivos e sei que grande parte deles acabarão por se revelar meras ilusões. E isso é bom, até porque, geralmente, o que nos sobra em racionalidade, falta-nos em fantasia. Procuramos inteligir tudo e abdicamos do prazer que nos proporciona a espontaneidade.

As melhores e mais importantes coisas que consegui resultaram do inesperado. Não planeei ir para Angola e quando dei conta estava lá. Algum tempo depois surgiu a possibilidade de vir para Cabo Verde e bastaram dois - sim, dois - e-mails para ter a certeza de que era mesmo isto que me apetecia fazer.

Às vezes dou por mim num grande sufoco, ansioso, sem um motivo em especial. Depois paro e percebo que estou apenas na expectativa. Expectante, nem sei bem de quê. Apenas assim.

Tudo é tão volátil - os empregos, as relações - porque é que temos de procurar ser tão definitivos connosco próprios?

Não me interpretem mal, sou um homem persistente e de compromissos. Assumo-os e levo-os a sério, sejam eles profissionais ou pessoais. Acontece que li há pouco tempo o livro Travessuras da Menina Má e percebi que, em certa medida, há qualquer coisa em Ricardo que me diz muito respeito. Uma vida inteira preso a uma ilusão, à espera de algo que só chega cinco décadas depois, tarde demais.

Não falo de mulheres, falo de tudo o resto (e também delas, porém). Não sei se foi pela conversa, que de alguma forma me chateou, pelo livro, por este post, ou apenas por culpa do vento que está a fazer abanar as janelas e a atirar com o lixo para o ar, mas hoje estou capaz de vos jurar que não há nada na puta da vida que justifique que a deixemos em suspenso enquanto esperamos que aconteça.


3 comentários:

Alda Couto disse...

Eu juro :):):)

Jardineiro do Rei disse...

... ao fim de uma vida, eu olho para trás, para todo um caminho, já longo em que tanto ficou por fazer, vejo pegadas na areia que o vento vai apagando, mas isso não me incomoda. É que na minha caminhada eu vou deixando mais pegadas... e construindo projectos e sonhos, muitos deles, a maioria, não vou ter tempo de os concretizar. Contudo, esses sonhos não realizados têm, em mim, um efeito muito especial. São eles que me mantêm vivo! Creio que morrerei no dia em que perder esta estranha e telúrica sensação de imortalidade que às vezes me domina e que me faz sonhar...

andorinhaavoaavoa disse...

Apesar de já não ter 28 anos, continuo sem certezas, agindo ao "improviso". Saber o que gostaríamos de ser, é o que nos resta! Segue as tuas escolhas! Podem ou não ser acertadas, mas olha é a vida!