31 de agosto de 2009

Como uma família

Tive a sorte de crescer numa família no clássico sentido do termo. Longe das novas configurações, fiz-me homem numa casa com uma mãe, um pai e um irmão. Também tive cães, gatos, pássaros e peixinhos.

Como em todas as famílias tradicionais (à moda antiga, se preferirem) fiz parte, como protagonista, integrante ou espectador, de episódios mais ou menos agradáveis. Vi os meus pais particularmente felizes, ou inversamente chateados. Ficaram zangados comigo, embora em número inferior às vezes em que os soube orgulhosos.

Não sei se estas vivências terão feito de mim uma pessoa mais feliz. Tenho a certeza que fizeram de mim aquilo que eu sou.

Sei também que nunca aceitarei menos do que aquilo que os meus pais simbolizam: um casal feliz, que ao fim de quase 30 anos de casamento continua sem acusar o peso de três décadas a partilhar tudo, do essencial ao acessório.

Assumo hoje que serei sempre muito exigente comigo próprio, com a pessoa que estiver ao meu lado e com o que isso representar. É pelos meus pais que me comprometo a ser mais do que um aluno "satisfaz" na escola da vida a dois. Reconheço que isso significará dissabores: não é fácil encontrar quem fale exactamente a nossa língua.

Não me tenho por ingénuo ao ponto de achar que casamentos e relações são [sempre] para sempre. Mas sou assertivo o suficiente para entender que enquanto duram devem ser levados a sério, fora e dentro deles.

Contas e férias separadas não entram na minha escala de valores. Tentar ser feliz com alguém implica abnegação e disponibilidade. Depende da capacidade de aceitar dar o mesmo que se espera receber. Quem me quiser terá de querer dividir mais do que a cama e a Tv Cabo. Sonhos, projectos, alegrias e frustrações também serão partilhados.

Posso passar muito tempo sozinho - todo um tempo futuro, talvez - mas não aceitarei nunca ser metade de mim, só porque alguém não me quer por inteiro.

Este texto é uma homenagem aos meus pais e ao que de mais valioso - sem darem por isso - me ensinaram. Obrigado a eles.

8 comentários:

Alda Couto disse...

E é lindo! :) O texto e o que diz. Também cresci assim, infelizmente não consegui dar o mesmo aos meus filhos. Resta-me a consolação de ter tentado.
Sorte, muita sorte é o que te desejo. O resto já tens.

Magda disse...

Muito bem. Gostei. Esse é tb o exemplo que tenho dos meus pais e o que já tomei para a minha vida. Felizmente encontrei alguem que pensava como eu embora dos pais dele nao tivesse esse exemplo.
E sim, os teus pais (ou pelo menos a tua mae) têm orgulho de ti. Eu fui aluna da tua mãe no longiquo ano de 1997 (se não me engano).

Orangina disse...

Tá lindo o Post!

Eu tb cresci num ambiente assim...somos uns sortudos em tê-los, porque nos transformaram no que somos hoje!!!

nana disse...

Também tive a sorte de nascer no seio de uma família equilibrada e consistente. Pensei muitas vezes que os meus pais não eram feitos um para o outro. Mas a verdade é que eles são o companheiro um do outro e, apesar das suas divergências, essa cumplicidade está acima de tudo.

Por acaso acho que já encontrei o "tal", e curiosamente foi há bem pouco tempo.
Mas devo dizer que fico sempre tocada quando um homem pensa e assume as palavras que escreveste.
Penso como tu. Não tenho a certeza se as contas devem ser partilhadas, mas o coração tem de estar aberto. Não acredito em relações descartáveis. Se se gosta, tem de haver empenho para proteger esse sentimento e defendê-lo dos percalços da vida e não desistir mesmo quando a desilusão se intromete.

Só queria dizer que gosto do que pensas e que, se não achasse que já encontrei o "tal" e se não vivesse a milhares de quilómetros de ti, gostava de te convidar para irmos beber um café... ou uma cuca...

Sereia disse...

Ao ler fiquei arrepiada...é emocionante viver assim, a 2 ou sozinho, mas desde que se viva intensamente e com paixão é fácil contagiar quem nos rodeia!

Anónimo disse...

Encontrei o homem que procurava ;P

Tambem penso assim e tambem tive a sorte de viver numa "verdadeira" familia. Outros tempos...

Nas relaçoes de alguns casais uma das coisas que mais me da que pensar e a forma de partilhar, ou nao. As compras a meias, as ferias a meias, os jantares a meias... Conheço, pelo menos, um casal assim e nao compreendo. Se a partilha nao e total nao pode haver o verdadeiro conceito de familia.

gralha disse...

Ai a mãezinha a limpar a lágrima no canto do olho ;)
Espero que os meus filhos escrevam um texto assim um dia.

Anónimo disse...

Texto lindíssimo.
Infelizmente, muitos e muitas não pensam dessa forma.Eu penso.
Já agora, recomendo a leitura do poema "Sísifo", de Miguel Torga.
Vale a pena ler. A sério.