29 de novembro de 2009

E se não é a minha Lena muito querida...

Olhem-me só para esta miúda, que é o orgulho do pai! A rapariga esteve comigo em Angola. Na altura não se depilava, mas agora está com muito bom aspecto e até já faz capas de revista. E pensar que vivemos juntos. Faz favor de ler o artigo.

28 de novembro de 2009

Mãe, não vais gostar disto:

Há uma série de verdades descobertas ou reconfirmadas depois de quinze dias em Cabo Verde. De todas, a mais crua é a de que o clima quente de África convida mesmo à cerveja.

Não consigo quantificar quantas cervejas é que já bebi desde que cá cheguei, mas como tenho a certeza de que o meu fígado anda a fazer as contas, um dia destes pergunto-lhe. Já experimentei a nacional, Strella - ligeiramente salgada - e a portuguesa Super Bock. É um consolo. Aquela coisinha gelada a escorregar pela garganta, hummmmm. Tão bom, tão bom, tão bom, que só tenho noção de mim próprio até à terceira do dia. Daí por diante, sejam dez ou vinte, who cares?

Presumo, mãe, que ainda não perdi o equilíbrio vez nenhuma, mas é provável que um dia precise de amparo para chegar a casa. Não te preocupes, as pessoas aqui são muito prestáveis.

Pena que tenha feito um contrato de arrendamento por um ano. Devo morrer antes disso: "Aqui jaz Nuno Andrade Ferreira, morreu novo, no dia em que o fígado lhe saiu no cocó".

21 de novembro de 2009

Contra a dengue... gritai, gritai

A campanha do Governo cabo-verdiano contra a Dengue não pára. Hoje de manhã, estava eu a montar uma mesinha de cabeceira - banquinha, como se diz por aqui - quando um camião decidiu estacionar no largo em frente à minha casa, ligar a gigantesca aparelhagem sonora que trazia no atrelado e debitar ruído durante uma hora inteirinha. Ouviu-se no bairro inteiro e sentiu-se no meu segundo andar. Aquilo eram vidros a vibrar, a porta a estremecer e sei lá mais o quê. Foram 60 minutos de uma gravação bilingue, com todo o tipo de conselhos para a humanidade.

Têm razão, comparado com o que se passou entre as 10 e as 11 o grilo defunto não incomodava ninguém. Assim os mosquitos vão desaparecer... de susto!

20 de novembro de 2009

A minha casa é um zoo


Vivo num jardim zoológico. Dormi três noites na minha nova casa e em três noites tive que aturar o desatino vocal de outros tantos bichos. Primeira noite: Um cão a ladrar durante horas a fio. Segunda noite: Um galo a cantar a partir das quatro da manhã. Terceira noite: um grilo na casa de banho. Sim, leram bem. Tinha um grilo dentro de casa, no wc, que cantou a noite toda.

O mais curioso de tudo isto é que tenho a casa (que é grande) vazia. Resultado, o barulho do grilo ecoou durante intermináveis horas pelas paredes despidas, repetindo-se até à exaustão. Acontece que eu só descobri o dito insecto hoje de manhã, quando o sujeito se decidiu a passear pelo tapete em frente à banheira. Depois do espectáculo da noite, devia estar a ir para casa dormir, o cabrão! Matei-o, claro. Matei-o e deixei-o num lugar bem visível, para os amigos perceberem o que lhes espera, assim decidam tentar a sua sorte.

Portanto, como vivo na FarmVille do Facebook, estou à espera que esta noite uma vaca me bata à porta para eu a ordenhar.

14 de novembro de 2009

A Casa

Depois de 3 (ou quatro?) dias em Cabo Verde, já tenho casa. Consegui alugar um apartamento muito jeitoso, a cinco minutos do trabalho. A ideia era mesmo essa: uma casa que, mesmo um pouco mais cara, me permitisse ir de casa para o trabalho e do trabalho para casa sem grandes complicações. Ainda que a cidade tenha uma rede relativamente organizada de transportes públicos (10 - 0 a Luanda), é sempre mais económico fazer as deslocações diárias a pé. Assim, consigo ir almoçar a casa e tudo. Para além do mais estou rodeado de sítios importantes: embaixadas (Estados Unidos e Portugal logo ali), Assembleia Nacional (onde em breve vou passar muitas horas) e Ministérios. De resto, o apartamento, um belo segundo andar, fica mesmo ao lado dos Negócios Estrangeiros.

Para já, a casa está vazia. Mudo-me, provavelmente, na segunda ou terça-feira, assim que comprar a cama. Vou faze-lo por um bom preço. Para já, as prioridades são o quarto e a cozinha. A sala ficará para outras núpcias.

"Não fui eu que disse isso"*

Todos os dias de manhã, assim que acordo, vou à casa de banho. Lavo a cara e olho-me ao espelho. Quer dizer, olho-me ao espelho assim que entro na casa de banho, até porque o lavatório está exactamente em frente à porta e não há como escapar. Bem, mas essa primeira vez não interessa nada, até porque não me presto grande atenção. O que é realmente importante é o que acontece depois de lavar a cara. Dou por mim a conversar com o meu próprio reflexo. Eu sei, isto parece conversa de doidos, mas poucas vezes estive tão certo duma frase como estou desta: Eu falo comigo, no espelho da minha casa de banho e, contudo, não sou eu que digo as coisas que costumo ouvir dizer.

Todas as manhãs, sem uma única excepção, aquele sujeito que está do outro lado do espelho - e que sou eu ou alguém muito parecido comigo - diz-me coisas que ou me envergonham, ou enaltecem. Na maior parte dos dias costumo ouvi-lo - ou ouvir-me, pelos vistos - dizer coisas sem qualquer sentido lógico, para a minha lógica imediata. Demoro sempre algum tempo a desmontar o que está subjacente àquelas conversas que mantenho com o meu reflexo, que não sou eu.

Quando me compreendo, acabo sempre, invariavelmente, por me dar razão.


*O mote desta semana é uma proposta dela, com participação dele.

11 de novembro de 2009

Primeiras impressões de Cabo Verde

E pronto, é isto. Parece que estou mesmo em Cabo Verde, sentado na secretária que vai ser minha nos próximos tempos. Porque não há nada como começar logo pela fresca, apanharam-me cedo na pensão onde passei a noite e daqui a pouco tenho a minha primeira saída. É o back to basics de que eu sentia saudades. Começou, entretanto, a busca por uma casa. Nem muito cara, nem muito longe. Poderá ser difícil conciliar as duas coisas. O jornal fica numa das zonas novas da cidade, mesmo ao lado da Assembleia Nacional e as rendas são tendencialmente caras. Será, portanto, uma questão de opção: uma casa um pouco mais cara, mas melhor, ao lado do emprego; ou uma casa mais barata, mais longe e talvez mais velha.

As primeiras impressões são positivas. Definitivamente, a Praia não tem nada a ver com Luanda. Tem o inevitável movimento de uma capital, mas está longe do fim do mundo em cuecas da sua congénere angolana.

Entretanto, já arranjei a minha primeira fonte: o recepcionista da residencial, o mesmo que me perguntou, para início de conversa, se eu gosto "de meninas".

Mais, em breve.

10 de novembro de 2009

9 de novembro de 2009

De quarta em diante

A partir de quarta-feira vou voltar a trabalhar em imprensa. Já experimentei todos os suportes - falta-me, de forma regular e sistemática, o on-line. No jornalismo, gosto especialmente de escrever. Encontro nos jornais a verdadeira essência da profissão Para mim, nenhum suporte é tão genuíno como o original. A palavra imprensa, a tinta no papel, a imagem (se forem boas imagens, ainda melhor) e o ritual da compra tornam-no quase transcendental.

Diz-se que os jornais vão acabar. Não quero acreditar nisso. Também se dizia que a rádio - com os CD's - e o cinema - com a VHS, imagine-se - iam acabar e, afinal, ainda aí estão. O que falta aos jornais - e às revistas, por defeito - é a capacidade de se reinventarem. Ninguém está disposto a pagar para ler (e ler é um exercício potencialmente chato) uma coisa a que acede à borla no FM do auto-rádio, no www da Web, num dos muitos canais do velho analógico e da nova TDT ou ainda no telemóvel. Perante isto, é muita presunção achar que alguém se vai dar ao trabalho e à despesa de comprar um jornal para ler mais das do mesmo das mesmas notícias reaquecidas, na melhor das hipóteses, do dia anterior.

Uma imprensa moderna terá de ser uma imprensa actuante, surpreendente, interventiva. Um jornal dos novos tempos terá de ser uma colectiva de inéditos, de histórias devidamente explicadas. Tem de acrescentar valor à informação. Este é o tempo daqueles que têm coragem de transformar artigos em reportagens e fazer desses textos pensados as verdadeiras notícias que marcam a agenda. Sobreviverão, quero acreditar, os jornais que não se limitarem a informar, mas que saibam, igualmente, assumir o seu papel formativo.

O projecto que aceitei integrar quer ser isto. Quer aprofundar as matérias, quer não só narrar histórias, mas explica-las aos leitores. Quer fazer - ambiciona fazer - bom jornalismo. Quer começar agora o caminho para lá chegar.

Não sei se serei um bom jornalista, mas gosto de gente que me dá valor. Depois de ter ajudado a fundar um canal de televisão, "refundar" um jornal parece-me um desafio muito interessante.

6 de novembro de 2009

Sou um amigo do alheio

Há uns anos, era eu estudante, marquei um encontro matinal, num Sábado, com uma colega de faculdade. Estávamos na época de exames e a ideia era tirarmos umas fotocópias de uns apontamentos. O encontro ficou marcado para as 10:30, no Colombo.

Como cheguei cedo, fui passear à Fnac. Vi livros, DVD e CD e, ao que parece, esqueci-me de um CD na mão, tapado pelos apontamentos que ia fotocopiar. Sem me aperceber do sucedido, saí. Tentei, pelo menos. Ao passar pela porta, soaram todos os alarmes da loja, fui rodeado por vários seguranças e prontamente conduzido a uma sala fechada. Não foi fácil explicar e repetir a explicação aos cinco gorilas que me ameaçavam, mas lá consegui provar a minha inocência.

O assunto mereceu umas valentes gargalhadas de amigos e família. O certo é que fiquei tão traumatizado com a situação que ainda hoje - e isto é rigorosamente verdade - continuo paranóico com as saídas das lojas que visito. Sempre, mas sempre, antes de sair de uma loja que tenha detectores, abrando o ritmo e percorro-me mentalmente, para tentar perceber se levo comigo alguma coisa que não me pertença. Da mesma forma, e apesar do exercício prévio, não deixo de suster a respiração naqueles segundos intermináveis. Continuo à espera do dia em que vou voltar a passar por ladrão. Porque vai acontecer, eu sei que vai.

5 de novembro de 2009

"... o homem ejaculou de repente, em jorros sucessivos que, ajoelhadas como estavam, as escravas receberam na cara e na boca..."

Não se assustem, é só uma citação do último livro do Saramago.

"Oh meu senhor, você está é com gonorreia!*

"... é com gonorreia".

Em zapping, só ouviu a parte final do que supõe ser uma fala de telenovela. Ou sitcom, dado o descabido. Nem sequer olhou para a imagem. Aconteceu exactamente antes de tocarem à campainha. Pegou no comando, tirou o som da televisão e foi à porta. Tem esta mania quase secular de nunca abrir a porta de casa sem antes baixar o volume da televisão. A gonorreia - a do tipo da novela, não a dele, claro - seria motivo de suficiente embaraço, mas aquilo que o chateia mesmo é imaginar que um visitante de ocasião - nunca programa visitas, logo não recebe visitantes que não os de circunstância - pode, pelo som que sai do aparelho, descobrir, de forma absolutamente inusitada, o que é que se passa naquela sala, para mais se aquilo que se passa é, acaso, um problema de gonococos.

Roda a chave uma, duas vezes e vai com a mão ao trinco. Apercebendo-se de que não faz ideia de quem seja, olha o relógio - não à procura de uma resposta, só para ver as horas - e espreita pelo "buraquinho", orifício ao qual não consegue associar outro nome. Do lado de lá, no patamar do seu segundo andar esquerdo, um indivíduo com um peculiar aspecto. São 21: 30 e à meia luz de uma lâmpada de escada, 40w, resta-se, impávido, um sujeito de aspecto cândido, segurando um livro que de tão grosso só pode ser sagrado.

"Vou abrir", convence-se.

"Boa noite".

"Boa noite. Posso-lhe falar da palavra de Deus?"

Três segundos de espera antes da resposta. Um, dois. "Sim, faça o favor de entrar". A resposta foi tão surpreendente que durante alguns instantes o próprio profeta quedou-se num sagrado silêncio, tão a propósito, dada a iminente chegada dos céus à terra.

"Entre, homem, entre". Logo reagiu o visitante, entretanto refeito do susto da afirmativa.

Encaminhado para sala, segurando a bíblia na mão direita e uma pastinha na esquerda, provavelmente carregada de Sentinelas, ajeita as calças, respira fundo, abri o santo livro na página previamente marca e sem esperar qualquer consentimento, dispara: "Então, esta cabrão tem mesmo gonorreia, não é verdade?"


*O mote desta semana, a ler aqui, aqui e aqui.

4 de novembro de 2009

Update sobre Cabo Verde

Daqui por uma semana, precisamente, estarei na cidade da Praia. Saio de Lisboa dia 10 e chego a Cabo Verde na madrugada de dia 11. É a segunda vez, em duas, que acontece assim. Também viajei de noite para Angola.

Continuo sem casa para morar. Já sei que vou passar os primeiros dias num hotel e talvez - talvez - fique o primeiro mês num apartamento "emprestado", enquanto procuro um poiso mais definitivo e o apetrecho mais importante: uma cama.

Daqui a poucos dias estarei a recomeçar de novo, "novamente". Os começos são sempre bons. Ao menos, quando nos estreamos, ainda não temos desilusões. Vou e não sei quando volto. Mas vou na mesma e esta liberdade, amigos, priceless.

Quando chegar ao arquipélago vou ter 27 anos (faço-os dia 9). Hei-de, então, experimentar trabalhar em mais um país. Contando com Portugal, mais Angola, serão três. É obra, para tão pouco tempo de vida. Cabo Verde é uma aposta pessoal minha. Os ordenados são muito inferiores aos que se praticam em Angola para os expatriados. Por isso, a oportunidade de valorização pessoal e profissional foram determinantes na minha decisão. Quero continuar a crescer como jornalista e, principalmente, enquanto Homem. Quero criar e ter liberdade criativa. Errar, reconhecer o erro e fazer melhor na vez seguinte.

Esta forma itinerante de levar a vida pode parecer uma parvoíce para a maior parte de vocês, mas saber que o mundo não se esgota no caso Freeport, no processo Casa Pia e nas goleadas do Benfica é um exercício ao qual todos se deviam obrigar. É que há tanto mundo por aí...

Este filme é...


... muito mau.

2 de novembro de 2009

Um post suburbano

Sou um rapaz da Margem Sul. Orgulhosamente, já tomei o pequeno almoço na Páscoa, almocei na Pérola da Cruz de Pau e fiz compras no Pingo Doce das Paivas. Também já acordei com o mau cheiro da baia do Seixal e fui assaltado no Miratejo. Andei de Rodoviária do Sul do Tejo e depois nos TST. Às vezes até apanhava um autocarro dos Belos. Atravessei o rio de Transtejo, primeiro num cacilheiro e depois de catamaran. Entretanto chegou o comboio e comecei a ir de Fertagus.

Nasci em Lisboa, mas o meu pai correu a registar-me na Arrentela. Fiz a primária na Torre da Marinha, o ciclo do Vale da Romeira e o secundário no Cavadas. Entretanto, fui estudar para Lisboa, não sem antes arranjar emprego na Amora. Cheguei a trabalhar num jornal chamado Margem Sul e ainda estive nas listas para uma eleição à Junta de Freguesia. Sou um suburbano e tenho muito orgulho nisso.

Por isso, é complicado perceber qual é o problema que os que moram do outro lado do rio têm em atravessar a ponte. "E se nos encontrássemos? Ah, claro, onde? Aqui na minha banda. Epá, isso é que não!".

Há uma espécie de fobia em relação à Margem Sul. Temos parques bonitos, cafés agradáveis, salas de cinema, teatros e auditórios (um deles recebe um dos maiores festivais de jazz do país, imaginem). Também temos muitos comunistas, é certo, mas estão todos vacinados.

O Barreiro pode não ser o principado do Mónaco, mas não consta que em Loures façam tortas como as de Azeitão. Da mesma maneira, não me parece que na Amadora - que terra, credo - haja uma serra como a da Arrábida. E em Oeiras, "serrá" que "carrregam" nos "rr's" como em Setúbal? Talvez enquanto "frritam" o choco.

A Margem Sul - independência já! - é isto, aquilo e o outro, mas no Verão e no Avante é vê-los em aprumado registo estival. Nem precisam de GPS para cá chegar.

Só não termino com um "Margem Norte jamais!", porque ainda me saem os planos furados - como ao outro - que isto nunca se sabe o que nos reserva o dia de amanhã. Mas fica esta, para memória futura: Caparica, Caparica, Caparica. Toma e embrulha.

António Sérgio


Habituei-me a ouvir o António Sérgio dentro do carro. Ou porque, à data sem casa, estava parado a namorar por aí, ou então, anos mais tarde, enquanto voltava tarde do trabalho. Foi dos poucos que me fez levantar o volume do rádio só para o ouvir falar ao microfone, muito mais do que para escutar as canções que escolhia.

Estive uma vez com ele, ao longe, sem contacto próximo. Ouvi-o, dessa vez, com a mesma atenção de todas as outras.

António Sérgio era um irreverente. E a mensagem que recebi no telemóvel, anunciando a sua morte, fez-me recuar até ao tempo em que "O Lobo" era a minha companhia das madrugadas.
A rádio em Portugal está hoje mais pobre. O país perde um grande comunicador e um guardião do jeito puro de falar "nas ondas do éter".

A dignidade que manteve até ao fim - mesmo depois de ser escorraçado de uma Comercial demasiado comercial - fazem dele um modelo de rectidão e profissionalismo. A cultura deste país precisa de visionários como ele. Até amanhã, camarada.

1 de novembro de 2009